domingo, 22 de fevereiro de 2015

Um olhar não diz tudo

[Você pode ler este texto ao som de: Ghost of You - My Chemical Romance]

Quem quer que estivesse reparando no brilho dos olhos de Ana, jamais pensaria que ela estava tramando um assassinato. A forma como ela olhava para seu alvo era tão voraz, que pensariam que ela estava interessada na pessoa cinco bancos à frente no metrô. A vítima sequer sabia que Ana estava ali. Na verdade, a vítima nunca soube que Ana existia. Amores platônicos tem muito disso.

Ana viu Paulo pela primeira vez no ensino médio, eles eram da mesma sala, mas ele nunca a notou. Nunca brincou com ela, nunca a defendeu de nenhuma brincadeira. Nem Paulo, nem ninguém da sala, nem os professores reparavam que Ana existia. Era como se Ana fosse um fantasma naquele lugar. Ela não tinha família. Então, desde que se conhecia por gente, ela era sozinha no mundo. Era uma garota deprimida. Oito anos haviam passado desde que ela percebeu que era invisível para seu amor.

Quando Paulo desceu na sua estação, Ana foi atrás. Com a faca escondida na manga, assim ela se vingaria por seu grande amor nunca ter notado a presença dela. Subiram as escada, chegaram ao bairro Liberdade e Paulo continuou andando, sem saber que estava sendo seguido. Subiu as escadas que davam para seu apartamento. Era de seu costume deixar a porta destrancada quando estivesse em casa. E assim, Ana entrou e viu Paulo deitado no sofá assistindo televisão.

Ela chegou por trás e o golpeou no peito. Uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete vezes. Parada para descansar, Ana escuta uma risada. Paulo continuava deitado ali no sofá, rindo para a televisão. Ana o golpeou de novo. Nada. A faca entrava e não fazia nada. Foi quando Ana reparou no espelho em cima da televisão. Ela não aparecia. Ana realmente não existia. Era um fantasma. Era por isso que ninguém a reparava. Era por isso que estava sempre sozinha. Ana gritou de desespero, mas ninguém ouviu.


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